João Vasconcelos Costa
Um texto sobre a educação liberal não pode deixar de começar pela evocação do Cardeal John Henry Newman, o teorizador do ensino de Oxford, na segunda metade do século XIX, mas agora cada vez mais actual. Newman discute a relação entre a tradicional educação liberal, para o conhecimento e a formação da mente, em relação à educação profissional ou vocacional, como hoje está mais na moda designá-la. Anote-se que a educação liberal é, mais propriamente a “liberal arts education” ou, como é mais comum na terminologia americana, a educação geral. Uma síntese esquemática do seu pensamento pode ser expressa como:
“A universidade educa as mentes. É a educação liberal. Ela é que é a base da educação útil, a profissional.”
Mas usemos as próprias palavras de Newman, no seu célebre livro de 1852, “The Idea of a University”:
“It is well to be a gentleman, it is well to have a cultivated intellect, a delicate taste, a candid, equitable dispassionate mind, a noble and courteous bearing in the conduct of life – these are the connatural qualities of a large knowledge, they are the objects of a University.”
Há aqui uma ideia fulcral: as características da formação da mente são conaturais ao conhecimento. Não há oposição entre as duas coisas, antes a sua complementaridade mútua. E mais ainda:
The purpose of a liberal arts education is to open the mind, to correct it, to refine it, to enable it to know, and to digest, master, rule, and use its knowledge, to give it power over its own faculties, application, flexibility, method, critical exactness, sagacity, resource, address, and eloquent expression. A habit of mind is formed which lasts through life, of which the attributes are, freedom, equitableness, calmness, moderation, and wisdom.
Vivemos numa época de massificação, em que se dilui a noção da elite. Elite sempre existiu e sempre terá de haver, sem qualquer contradição com os valores democráticos. A questão que se coloca hoje é a da formação especial dessa elite. Pode ser apenas a camada detentora, simplesmente, do maior nível de conhecimento e informação, ou deve a universidade, sua formadora secular, enquadrar o mero conhecimento numa formação mais vasta, de pessoas com cultura e compreensão do passado/hoje/futuro, espírito cívico, responsabilidade de cidadania, e muito mais?
Com todas as adaptações às necessidades de formação tecnológica das sociedades modernas, Oxbridge (o acrónimo para o modelo de Oxford e Cambridge) continua a ter como fundo o conceito do “well educated gentlemen”, enfatizando o desenvolvimento das capacidades mentais, a cultura geral ampla, a compreensão do universo, do homem e da história, a formação científica diversificada, a formação do carácter, a responsabilidade social, cívica e política.
As universidades “top”, de que vou considerar, para diante, Harvard como exemplo, têm o seu sucesso na forma como conseguiram harmonizar esses conceitos clássicos com as necessidades técnicas das formações modernas. Afinal, foi o aproveitamento ecléctico do melhor que podia ser dado pelos três grandes modelos da universidade moderna, fruto da consolidação da noção de Estado, no início do século XIX:
- A universidade humboldtiana, tendo como valores principais a ciência e a verdade, a liberdade académica;
- A universidade napoleónica, mais orientada, pragmaticamente, para a alta competência profissional (na época, por exemplo, o grande ensino de “ponts et chaussées”);
- A universidade newmaniana, privilegiando a cultura, o carácter e a educação do “gentleman”.
No pós-guerra dos anos 50, começa a ser nítida, em desfavor destes modelos tradicionais, uma deriva utilitarista da educação superior, que é marcada pela ênfase nos objectivos sócio-económicos, no predomínio da formação profissional e num acentuada especialização dos cursos, na organização dos currículos tendo em conta, prioritariamente, os conhecimentos e as aptidões específicas, com acentuada compartimentação disciplinar e com percursos formativos muito rígidos.
Em Portugal, muito compreensivelmente, depois do 25 de Abril, todo o enquadramento ideológico levou a um exagero desta deriva utilitarista. No entanto, a fonte de inspiração, americana, manteve algumas defesas importantes. São exemplos a manutenção das formações “major” e “minor” (um engenheiro tem um semestre em história, por exemplo), os currículos flexíveis, a tutoria e, principalmente, nas últimas décadas, os “colleges” de graduação de 1º ciclo (BSc e BA) com ênfase na educação geral.
Entretanto, na clássica espiral dialéctica, em que parece que se volta atrás, mas sempre num nível superior, é a evolução do trabalho que marca a nova fase da missão das universidades. Com a sociedade do conhecimento, estamos no pós-taylorismo. O trabalho de linha de produção já começa a ser anacrónico. Antigamente, o quadro ajustava-se quase que para toda a vida a uma linha em que tinha um lugar definido que só lhe exigia actualização de conhecimentos tecnológicos e até com ciclos relativamente longos. Hoje, a inovação faz-se por projectos horizontais, de duração curta e com grande interdisciplinaridade, que implicam grande capacidade de liderança, de trabalho de equipa, por consequência formações científicas largas favorecedoras do diálogo interdisciplinar, capacidade de adaptação, cultura de iniciativa e de inovação, capacidade de aprendizagem permanente.
É isto que está na base do novo paradigma de Bolonha: formação de banda larga, especialização só a segundo nível, competências transversais, aprender a aprender, formação cultural, responsabilidade social.
Neste contexto, a questão essencial é a da relação entre a formação universitária e o mercado do trabalho. A visão tradicional é a da formação para o emprego dirigido. Isto já começa a ser utópico. O mercado de trabalho está a ficar rapidamente muito complexo, o que traz para primeiro plano um problema essencial, o da diferença de ritmos. A universidade é lenta, nos seus processos, nas suas mudanças culturais internas e não pode acompanhar a velocidade das mudanças sociais. É ilusão pensar-se que a universidade pode dar resposta atempada às solicitações do mercado de trabalho. Por outro lado, estas solicitações são, frequentemente, conjunturais e de ciclo curto, contra a necessária estabilidade temporal, mais longa, da programação universitária.
Questão muito diferente, e hoje crucial, é a da formação universitária para a empregabilidade, em sentido mais difuso. Actualmente, o diplomado tem de aceitar que não vai trabalhar obrigatoriamente na sua área específica de formação. Isto tem muito a ver com o conceito tradicional de “profissões de qualificação superior”. Hoje isto está esbatido, em termos de competição nas profissões mais diversas. Bancário, gerente de uma livraria, funcionário da administração, empresário de uma pequena empresa de qualquer área, fornecedor de serviços diversos, agente turístico (tenho um amigo muito bem sucedido nesta área que é licenciado em história), tanto mais, são actividades que não associamos obrigatoriamente à posse de um diploma universitário. Mas todos os dados comprovam, nesta empregabilidade difusa, a vantagem competitiva da educação superior. A taxa de desemprego é menor, a remuneração média é superior, o crédito bancário é mais fácil, o tempo de reemprego é menor, etc.
Voltando a Newman,
“General culture of mind is the best aid to professional and scientific study, and educated men can do what illiterate cannot; and the man who has learned to think and to reason and to compare and to discriminate and to analyze, who has refined his taste, and formed his judgment, and sharpened his mental vision, will not indeed at once be a lawyer, or a pleader, or an orator, or a statesman, or a physician, or a good landlord, or a man of business, or a soldier, or an engineer, or a chemist, or a geologist, or an antiquarian, but he will be placed in that state of intellect in which he can take up any one of the sciences or callings I have referred to, or any other for which he has a taste or special talent, with an ease, a grace, a versatility, and a success, to which another is a stranger. In this sense, then, and as yet I have said but a very few words on a large subject, mental culture is emphatically useful.”
(À margem, note-se a beleza desta escrita. É uma coisa que a educação liberal educa, o “effective writing”. Mozart dizia que, nas suas composições, não havia nem uma nota a mais nem uma nota a menos. Aqui, não há nem uma palavra a mais nem uma palavra a menos.)
A reorganização do Harvard College
Como disse atrás, vou tomar Harvard como exemplo. No entanto, exemplo é muito diferente de cópia! Copiar a Mona Lisa é ridículo, mas refazê-la com o Tejo em fundo pode ser uma coisa bem interessante. Alguns desconhecerão que há duas entidades Harvard relativamente distintas. A Universidade de Harvard, com as suas célebres escolas, dedica-se principalmente ao ensino pós-graduado. A outra instituição é o Harvard College, para o ensino de graduação, de onde a grande maioria dos estudantes transita para as escolas. Nos últimos dois anos, o Harvard College procedeu a uma total reorganização, no sentido da educação liberal.
“Numa época de especialização e profissionalismo, o Harvard College reafirma os seu compromisso com uma educação liberal nas artes e nas ciências. (…) É nosso objectivo alargar as oportunidades para os nossos estudantes virem a ser indivíduos independentes, dominadores do conhecimento, rigorosos e criativos“.
E, em termos mais concretos e bem ilustrativos,
“Qualquer estudante deve ser capaz de perceber as notícias e os artigos expositivos de revistas como a Science e a Nature.
Não se pode aceitar a ideia de que alguns estudantes de humanidades são incapazes de aprender ciência, tal como não se pode aceitar a ideia de que outros, de ciências, não são capazes de aprender matérias das humanidades e das ciências sociais.”
Voltando à educação liberal
Quais as suas grandes vantagens?
1. Ensina o estudante a pensar
Ensina a ordenar a mente, a compreender a estrutura do pensamento, a sua “gramática”, as suas regras. Estudar um programa de computador, uma estrutura musical, até a lógica de um poema, dá acesso a uma coisa talvez dificilmente definível, o “movimento da mente”. Se eu estudar poesia, formar-me em economia e nunca escrever um poema, mesmo assim a minha vida ficou mais rica.
Daí uma visão global, filosófica e ética, mas não forçada, sempre construída por cada um. Contrapôs-me um colega que esta perspectiva de educação liberal acabaria por ser uma forma de indoutrinação. Contesto em absoluto. Quem viveu, como os da minha geração, a indoutrinação salazarista, sabe muito bem que ela só foi possível pela ignorância, pela diminuição educacional do espírito critico. O que é hoje importante, essencialmente na formação universitária das elites, é pensar por si próprio, criticar a manipulação, ter opinião fundamentada como cidadão.
Um pouco caricaturalmente, pode-se dizer que uma pessoa assim educada está muito mais apta a decidir o seu voto tendo em conta a crítica aos programas eleitorais, a perceber o que está em causa na discussão do orçamento, a decidir sobre as questões fracturantes, como o aborto ou o casamento de homossexuais.
2. Ensina o estudante a aprender
Aprender a aprender é provavelmente hoje o ponto central da educação superior. A universidade deixou definitivamente de conferir uma habilitação para a estabilidade da vida profissional, cultural e cívica. Aquilo que eu estudei na universidade é apenas, hoje, raízes ténues da minha formação intelectual – vou mais longe, talvez pernosticamente – da minha afirmação sessentona como sabedor.
Os professores actuais, eu próprio me confesso, têm tendência para desvalorizar culturalmente os jovens que lhes chegam. Têm razão, mas num quadro tradicional. Em alguns aspectos, estes jovens são muito mais cultos em termos de modernidade. É um erro padronizarmos a cultura em termos do que é o nosso padrão pessoal e geracional. Neste sentido, a cultura é um livro potencialmente morto. Mais importante, para a nova/velha educação, é fornecer um telescópio em vez de um livro. É ele que abra horizontes infinitos. Que o diga o velho pisano.
Outra ideia óbvia, mas nem sempre interiorizada, é que quanto mais se aprende, mais se consegue aprender. Esta é uma ideia óbvia se pensarmos em coisas muito simples. Há aprendizagens básicas, na nossa vida banal, que nunca esquecemos. Quando se aprendeu a nadar ou a andar de bicicleta, nunca mais se esquece. Mas há muitos outros exemplos a lembrar: aprender as regras básicas do raciocínio probabilístico, ser capaz de, diante de um “outdoor” eleitoral, pensar criticamente naquela mensagem, muitas vezes manipuladora, etc.
Outra coisa importante, a favor de uma valorização não imediatista das competências e do conhecimento, é a noção de que o conhecimento antigo ajuda o novo conhecimento. Desde logo, porque, adquirido na altura certa e da forma certa, há conhecimentos ou aptidões inesquecíveis. Todos sabemos que nunca mais se deixa de saber nadar ou andar de bicicleta. E um conhecimento interiorizado chama outro. Já que referi habilidades físicas, dou um exemplo pessoal. Em jovem, joguei muito ténis. Muitos anos depois, iniciei-me no golfe e o meu instrutor disse-me logo que sabia que eu era tenista, porque estava no fundo do meu corpo uma coisa comum aos dois desportos, que é o “swing” do tronco. Na mente, não é o mesmo?
3. Constrói a sabedoria e a visão global
A ênfase no domínio de especialização distorce a compreensão da realidade. Vemos isto todos os dias, nos artigos de opinião dos jornais. Podem ser muito inteligentes mas, na maioria dos casos, se fizermos o exercício de ler um artigo sem ver quem é o autor, facilmente chegamos à conclusão de que foi escrito por um jurista, por um economista, por um empresário, por um politico profissional.
A sabedoria é ver a vida como um todo – como cidadão, como profissional, como pai. E também, coisa essencial, como professor. Isto deixou de ser uma profissão. Na sociedade do conhecimento, todos somos professores, todos ensinamos os nossos colaboradores mais jovens, todos exercemos a pedagogia, em sentido amplo, na nossa intervenção social, desde a conversa inteligente no “coffee break” de trabalho, ao modesto artigo na net sobre a nossa especialidade, até ao artigo de “opinion maker” largamente difundido.
Isto pressupõe educação de elite, para o rigor do que transmitimos aos outros. Também auto-educação. Novamente Newman – “The pursuit of knowledge will draw your mind off from the things which will harm it“.
Finalmente, dá prazer ser-se culto, mesmo desculpando alguma atitude narcísica que daí venha.
A educação geral
Um exemplo típico da educação liberal é Darwin. Começou por estudar Teologia. A meio do curso, conheceu um professor de geologia, coisa então muito recente, que o fascinou. Esse professor deu-lhe a ideia de que o grande futuro da geologia seria a sua associação à biologia, coisa que estava a criar a paleontologia. Depois foi a epopeia intelectual da viagem do Beagle, em que Darwin não era coisa nenhuma, segundo os nossos padrões actuais de especialização. O que ele era, com tudo isso, era uma cabeça brilhante, cultivada pela universidade inglesa, aberta à criatividade.
Será isto possível hoje? Certamente que não. O lucro de um sistema destes, que é o de gerar génios, não é facilmente compensado pelo desperdício de formar, neste esquema, uma grande maioria de diplomados desvalorizados.
A tendência actual, em muitas das grandes universidades americanas, é para o que designarei como um sistema misto. São muitas e das mais prestigiadas: Harvard, Stanford, Chicago, Dartmouth, Columbia, New Jersey, muitas mais.
Este é um esquema muito geral. No programa de “bachelor” há uma transição gradual de uma educação muito generalista para a chamada concentração, de disciplinas de uma área definida de saber.
Naquilo que, na terminologia bolonhesa, chamamos de 1º ciclo (licenciatura) há uma transição suave entre uma educação liberal e uma formação orientada para um perfil profissionalizante, que só é verdadeiramente afirmada a segundo nível, de mestrado ou de doutoramento. Quem ficar por aqui, ao nível de “bachelor”, tem de se defrontar com expectativas de emprego do género que defini atrás como de “empregabilidade” geral.
Um esquema um pouco mais detalhado pode dar melhor compreensão do modelo.
A educação geral está representada a verde e a especializada (concentração) a cor de laranja. A lista de departamentos é apenas exemplificativa. As setas vermelhas indicam os percursos dos estudantes e as setas azuis as contribuições docentes, dos departamentos e da própria “faculty” do “college”.
Para se ter alguma ideia do que é de diferente um primeiro ano de educação liberal, basta ver as designações desses programas. Em Harvard, as “distributions” até têm designações relativamente convencionais: Artes e humanidades, Estudo das sociedades, Ciência e tecnologia, “Effective writing”. Outras marcam bem a diferença: Civilização contemporânea e humanidades, em Columbia; Problemas da cidadania, em Stanford; Humanidades e civilização, e Ciências naturais e matemáticas, em Chicago; Cultura mundial, em Dartmouth; Sociedade, ética e tecnologia (de Atenas a Nova Iorque), em New Jersey. Se me propusessem um nome para uma “disciplina” destas em Portugal, proporia, à primeira vista, “Civilização: ontem, hoje e amanhã”.
Contra corrente?
Para total coerência, um modelo de educação liberal, no 1º ciclo, aponta para uma grande valorização da continuação de estudos, pelo menos até ao mestrado. Isto significa que, em regra, seria desejável uma formação de cinco anos, adoptando-se o esquema 3+2.
É provável que haja, entre nós, factores sociais e culturais adversos a este desiderato. Infelizmente, estudantes e famílias não valorizam muito a qualidade da formação. Desejam é um diploma, seja ele o que for, que seja passaporte para uma vida de “emprego superior”. Se até o poderão ter, com Bolonha, em menor tempo do que até agora, tanto melhor, obtêm o mesmo produto “social” com menores custos.
Depois, a desconfiança provável em relação a uma licenciatura generalista. Para que serve, que emprego garante? A percepção da nova noção de empregabilidade, discutida atrás, ainda é praticamente inexistente entre nós. É certo que a situação americana é muito distante da nossa, mas vejamos um exemplo, retirado da base de dados sobre o emprego dos “bachelors” da U. Chicago (excluindo os que prosseguem os estudos). A percentagem de empregados em actividades não relacionadas directamente com a formação é de 40% em Matemática, 47% em Biologia, 33% em Economia, 55% em História, 41% em Humanidades. Em relação a este último caso, note-se que, ao contrário do predomínio actual das nossas licenciaturas em Comunicação Social, 19% dos BA (Humanidades) de Chicago estão empregados nos jornais, nas rádios e na TV.
Repito uma “blague” que refiro muitas vezes: a maior concentração mundial de falantes de grego clássico está na City de Londres!
Constrições portuguesas
O sistema português e a sua legislação coloca grandes problemas a um modelo de educação liberal, mas também me parece permitir pelo menos a ultrapassagem parcial de alguns desses problemas.
a) Designação específica da licenciatura ou mestrado. Pode parecer questão menor, mas é obviamente mais fácil dar sentido ao modelo quando, como nos EUA, o grau é simplesmente de BSc (“Bachelor in Sciences”) ou de BA (“Bachelor in Arts”). Podemos ultrapassar isto designando todas as licenciaturas em ciências como tal, seguido, entre parênteses, pela área de concentração.
b) Vagas por licenciatura. Este é um óbice maior. Uma das características essenciais da educação liberal, e também uma das suas grandes vantagens, é a de permitir aos alunos uma grande flexibilidade de percurso e a escolha da concentração em fase posterior à entrada na universidade. Teoricamente, quase se poderia dizer que o primeiro ano é comum e que, portanto, o estudante é simplesmente admitido na universidade, não num curso específico. Não vejo que isto seja muito fácil em Portugal, com o actual regime de acesso e com provas específicas.
c) Financiamento. Como disse, este modelo valoriza o prosseguimento de estudos para o mestrado. Mesmo que os mestrados venham a ser financiados ou que as universidades os possam fornecer com base apenas no respectivo componente na fórmula de financiamento, fica de fora a acção social escolar, nomeadamente as bolsas, para a continuação para o mestrado.
d) Preparação dos professores e dos estudantes. É óbvio que este modelo é uma “revolução cultural” da universidade. Não me preocupa tanto a adaptação a ela por parte dos professores. Afinal, terão de fazer praticamente o mesmo para a concretização do paradigma de aprendizagem de Bolonha. Pior serão os estudantes. Uma universidade que, eventualmente, adopte um modelo destes, terá de trabalhar em grande colaboração com o ensino secundário.
Em conclusão, ou melhor, em dúvida
Será que ainda verei em Portugal uma “Harvard” (obviamente que as aspas significam muito, em termos realistas)?
PS – Um comentário geral a este artigo, enviado por José-Ginés Mora, autoridade internacional em política da educação superior: “I believe that liberal education is today, at the same time, the education most utilitarian.”